3.3.2 - Espumas flexíveis convencionais

As propriedades mecânicas de uma espuma flexível dependem tanto da geometria macroscópica das células quanto da morfologia microscópica da espuma. A figura 3.3, mostra a morfologia das espumas flexíveis convencionais preparadas com alto e baixo teor de água.

A) fotografia da estrutura com células abertas; B) representação esquemática da estrutura celular; c) espuma feita com alto teor de água; d) espuma feita com baixo teor de água; e) esfera de poliuréia; f) fase contínua; g) domínios rígidos.
Figura 3.3 – Morfologia das espumas flexíveis convencionais

Nas espumas flexíveis convencionais de poliol poliéter, após a mistura do poliol com o TDI é formada uma mistura homogênea, na qual a água é solúvel até cerca de 3,5 partes, dependendo do teor de EO do poliol. Acima deste teor, a água fica emulsionada na mistura poliol/isocianato sendo estabilizada pelo surfactante de silicone. Em baixos teores, a água está solúvel e reage com o isocianato formando poliuréia, que inicialmente é completamente solúvel. Numa determinada concentração e/ou peso molecular, ocorre à separação de fases e a formação dos domínios rígidos de poliuréia. Em altos teores de água, forma-se uma terceira fase, constituída dos domínios rígidos aglomerados de poliuréia (esferas de poliuréia). Inicialmente, durante etapa de agitação (Figura 3.4), ocorre a mistura do ar, com os ingredientes líquidos. O surfactante de silicone reduz a tensão superficial, resultando numa maior superfície para uma dada quantidade de energia fornecida ao sistema. Este processo é chamado de nucleação. O surfactante de silicone estabiliza as bolhas de gás evitando seu rompimento e coalescência. Sem a dispersão de ar, a espuma não pode ser feita, visto que as bolhas formadas pelo dióxido de carbono são energeticamente desfavoráveis.

a) ar; b) poliol, água e aditivos; c) isocianato; d) matérias-primas; e) mistura e nucleação; f) creme e início do crescimento; g) crescimento, h) separação de fase, suspiro e gelificação; i) cura.

Etapas

Mistura

Creme

Crescimento

Suspiro

Cura e pós cura

Tempo

0

10 s

60 s

horas a dias

Fenômenos físicos

dispersão das bolhas e reagentes

mudança de cor

aumento da viscosidade

abertura das células aumento do módulo

aumento do suporte de carga

Fenômenos cinéticos

colisões das moléculas

reação água + isocianato

reação poliol + isocianato e aumento do peso molecular

difusão

Morfologia

 

expansão das bolhas

formação dos domínios rígidos

precipitação da poliuréia

ruptura da membrana das células

 

Figura 3.4 – Etapas da formação da espuma flexível convencional

Após cerca de cinco segundos de mistura o líquido começa a ficar cremoso, o que é indicativo do início da reação água/isocianato. O gás carbônico gerado difunde para as bolhas de ar pré-formadas, expandindo-as. Não ocorre formação de novas bolhas durante a expansão da espuma, sendo o número de células finais igual ao número de núcleos inicialmente formados. Nesta fase ocorre principalmente a reação do isocianato com a água, numa relação 1/1 molar, com liberação de calor, gás carbônico e formação de poliuréia. A reação de formação de poliuretano não é detectada. Quando se atinge uma densidade de cerca de 250 g/l, que corresponde a um volume aproximado de ar de 75%, as bolhas esféricas se tocam e o volume tetraédrico torna-se grande em relação ao volume total. Neste ponto as células esféricas tornam-se poliédricas (Figura 3.5).

Figura 3.5 - Transição da estrutura esférica para a poliédrica

O acompanhamento do crescimento da espuma por espectrometria de absorção no infravermelho (IR), mostra: uma absorção inicial em 1700 cm-1 (hidrogênio não ligado do grupo uréia); um gradual crescimento da absorção em 1666 cm-1 (hidrogênio mono-ligado); e o desaparecimento desta última e o surgimento de absorção em 1645 cm-1 (hidrogênio bi-ligado). Junto com o aparecimento da absorção em 1645 cm-1 ocorre um súbito aumento da viscosidade. Este fato é atribuído a separação da fase de poliuréia. Esta segregação de fase ocasiona o rompimento mecânico das células da espuma, e depende da quantidade de água utilizada, em diferentes temperaturas. Após a abertura das células a expansão da espuma cessa, porém as reações químicas prosseguem, a temperatura se eleva, e o módulo aumenta devido à conclusão da reticulação da cadeia polimérica. A razão da separação de fase (“precipitação da uréia”) é assunto em discussão na literatura. Ela é maior em sistemas onde parte da água está em emulsão na mistura inicial de poliéter/isocianato. Neste caso, temos uma alta concentração localizada de água, que resulta numa alta concentração de poliuréia, acarretando a separação da fase poliuréia, quando um certo peso molecular do PU é atingido.

           

Figura 3.6 - Esquema da estrutura de domínios de poliuréia

Além da separação macrofásica, ocorre também uma separação microfásica na escala nanométrica, detectadas por microscopia eletrônica de transmissão (Figura 3.3). Diversos segmentos de poliuréia interagem, através de ligações hidrogênio (Figura 3.6), formando domínios rígidos separados da fase flexível. É observado o efeito do silicone na produção de microfases menores, devido a eficiente emulsão da água na mistura poliol/isocianato. Com uma técnica especial pode ser demonstrado que nas espumas de poliéter, aproximadamente 65% de todos os segmentos têm o tamanho de menos de duas unidades de poliuréia e o restante acima de quatro.

 

3.3.3 - Espumas de alta resiliência