3.2 - Matérias Primas

Nos processos de fabricação de espumas flexíveis são utilizadas diferentes matérias-primas, como polióis, isocianatos, água, catalisadores, surfactantes, agentes de expansão auxiliares, retardantes de chama, pigmentos, cargas, etc.

 

3.2.1 - Polióis

Diversos tipos de polióis (Capítulo 1) são empregados na fabricação dos diferentes tipos de espumas flexíveis de PU. Destes, os principais são os polióis poliéteres (PPG's) e polióis poliméricos de diferentes estruturas, usados nas espumas convencionais e de alta resiliência, e ainda, os polióis poliésteres, óleo de mamona, e outros polióis obtidos a partir de óleos vegetais (Capítulo 1).

Polióis poliéteres

As propriedades das espumas flexíveis dependem da estrutura química do poliol poliéter (PPG) (Capítulo 1) utilizado, como funcionalidade, tamanho da cadeia e tipo de epóxido empregado. Os PPG's normalmente (Tabela 3.1) têm funcionalidade entre 2 e 3, peso molecular entre 3000 e 6000, correspondendo a pesos equivalentes entre 1000 e 2000, e são obtidos pela reação de um triol (ex. glicerina) com óxidos de propileno (PO) e etileno (EO). Os polióis poliéteres produzidos com óxido de propileno (PO) são os mais utilizados. A quantidade e posição do óxido de etileno (EO) na cadeia do poliol tem grande influência nas suas propriedades, e o EO pode estar distribuído ao acaso, ou em blocos. O teor de EO presente nos polióis poliéteres varia entre 5% e 15% e o aumento do teor de EO resulta em maior hidrofilicidade do poliol. No Capítulo 3.5 são mostradas formulações tipicas de diferentes tipos de espuma.

Espumas convencionais

As espumas flexíveis convencionais fabricadas em bloco, em geral são produzidas por processos a quente utilizando poliol poliéter. Estas espumas, fabricadas com densidades entre 8 e 50 kg/m3, são empregadas principalmente em colchões e estofados. Normalmente, os polióis poliéteres usados são tri funcionais, obtidos a partir de glicerina e PO, possuem hidroxilas secundárias, número de OH entre 40 e 56 mg de KOH/g, pesos moleculares entre 4000 e 3000, e viscosidade em torno de 500 mPa.s. São também utilizados polióis poliéteres hidrofílicos, a base de PO com EO distribuído ao acaso na cadeia polimérica. Estes polióis têm como vantagem proporcionar uma maior solubilidade da água usada como agente de expansão. Isto acarreta uma menor concentração de micelas de água na massa reagente, e minimiza a formação de esferas de poliuréia que enrijecem a espuma (Capítulo 3).

Espumas de alta resiliência

As espumas de alta resiliência (HR) fabricadas com densidades entre 25 e 60 kg/m3, são mais macias que as convencionais de mesma densidade, possuem maior suporte de carga e curva de tensão/deformação típica, semelhante à da espuma de látex de borracha. Na fabricação destas espumas são empregados poliéteres trióis reativos, feitos com óxidos de propileno/etileno, de peso molecular entre 4500 e 6000, com alto teor de hidroxilas primárias, e número de OH entre 28 e 38 mg de KOH/g. Para o ajuste do suporte de carga são usados extensores de cadeia, como a dietanol amina (DEA), resultando no aumento do teor de segmentos rígidos da espuma. A maior reatividade das matérias primas empregadas, resulta numa morfologia (Capítulo 3) diferente da observada nas espumas convencionais. Devido à alta reatividade do poliol, não são necessários o emprego de estabilizadores de espuma, do tipo poliéter polisiloxanos, e catalisadores organo metálicos para a catálise da reação de reticulação.

Para o aumento do suporte de carga também podem ser utilizados polióis poliméricos (Capítulo 1). Neste caso, o uso de polisiloxanos e catalisadores organo metálicos pode ser necessário, uma vez que polióis poliméricos com grupos hidroxila secundários são menos reativos.

Poliol poliéster

As espumas flexíveis de poliéster são o segundo grupo mais importante de espumas flexíveis de PU produzidas em bloco. Em comparação com as espumas de poliéter da mesma densidade, as espumas de poliéster apresentam as seguintes características: estrutura celular regular e controle preciso do tamanho de célula; maior resistência ao fluxo de ar, e então melhor absorção acústica; maior resistência mecânica; maior histerese e menor elasticidade, e então melhor absorção de choque; menos afetada por solventes orgânicos e detergentes, porém mais rapidamente afetada por água e calor (hidrólise); taxa de oxidação mais lenta, e melhor adesão.

As espumas flexíveis base éster usadas na indústria automotiva são combinações da espuma revestida com outros materiais como tecido ou filme. Tecidos sintéticos unidos com folhas de espuma através de laminação à chama (Capitulo 3.9) são os predominantemente usados como o material standard para os assentos de veículos. Espumas de poliéster, ou tipos especiais de espumas de poliéter são as usadas para este propósito. A laminação da espuma flexível com diferentes tipos de tecidos pode ser conduzida de forma bastante econômica através de laminação por fogo. Este processo utiliza um queimador à chama para o derretimento da camada superficial da espuma, a qual entra em contato com o substrato que a irá revestir, passando então, por uma calandra para promover a acoplagem. As espumas de poliéster são as mais adequadas devido às suas características de fusão mais favoráveis. Alem disso a espuma de poliéster têxtil é caracterizada por uma estrutura celular muito boa e melhores propriedades de tensão e alongamento e adesão. Os polióis poliéster, especialmente os poliadipatos, são ainda os preferidos no mercado espumas flexíveis, para forros têxteis, brinquedos, artigos esportivos, pigs (Capítulo 7.4), etc.

As espumas flexíveis de poliol poliéster (Capítulo 1) são normalmente produzidas com densidades entre 20-45 kg/m3 e tem estrutura celular mais fina do que as de poliéter. São usadas em aplicações como ombreiras, embalagem, absorção acústica, laminação, aplicação de cosméticos, limpeza de tubulações (PIGs), e industria automotiva.

Os polióis poliéster mais utilizados são poliadipatos glicóis, normalmente a base de dietileno glicol (DEG) e trimetilol propano (TMP), com peso molecular de 1.500 a 3.000 com fucionalidade entre 2,05 e 2,2, e número de OH entre 58-62 mg KOH/g. A funcionalidade maior do que dois é importante para reticular a espuma e aumentar a estabilidade e as propriedades. As propriedades das espumas dependem da estrutura do poliol poliéster usado e a adição de poliol poliéster altamente ramificado conduz a obtenção de espumas semi-rígidas. As espumas para uso têxtil, cuja principal característica é o grande alongamento, são feitas com poliol com cadeia pouco ramificada e índice menor de TDI-80.

O isocianato mais utilizado é o TDI-80, e para espumas de maior dureza o TDI-65. Normalmente é empregado um índice entre 90 e 120. Como os polióis poliésteres têm hidroxilas primárias e são bastante reativos é suficiente o emprego de catalisadores menos efetivos, a base de aminas terciárias. Aminas como a N-etilmorfolina (NEM), N,N-dimetilbenzilamina (DMBA), N,N-dimetilciclohexilamina (DMCHA), N.N-dimetilcetilamina (DMCA), são as mais adequadas.

A alta viscosidade do poliol poliéster, sua miscibilidade com a água, e sua rápida polimerização facilitam a mistura e a estabilização da espuma em crescimento, permitindo o emprego de surfactantes anionicamente ativos, como o ricinoleicosulfonato de sódio, poliéter siloxanos de baixa atividade, e emulsificantes não iônicos. O sincronismo da reação é possível pela variação da quantidade de emulsificante. Desta maneira, as rachaduras ou colapso da espuma e o encolhimento podem ser eliminados. A adição de óleo parafínico ou polidimetilsiloxanos serve como regulador do tamanho das células, sendo utilizada na produção de espumas com células grandes e uniformes. A seguir são mostradas formulações padrão de espumas flexíveis de poliol poliéster de grau técnico e para laminação.

Formulação

Grau técnico

Grau laminação

Poliol linear (OH = 60 mg de KOH/g)

100

100

100

-

Poliol ramificado (OH = 50 mg de KOH/g)

-

-

-

100

Água

4,3

3,7

3,6

3.6

Amina terciária (NEM)

1,6

2,5

1,3

1,5

Amina terciária (DMCHA)

-

-

0,05

0,1

Surfactante não iônico

-

1,0

1,0

1,0

Surfactante de silicone

1,2

1,0

0,9

0,8

TDI 80 (índice)

105

105

90

90

Propriedades

Densidade (kg/m3)

25

29

30

29

Resistência à compressão (40%) (kPa)

5,5

nd

nd

nd

Alongamento na ruptura (%)

200

nd

nd

nd

Tensão de ruptura (kPa)

175

nd

nd

nd

Deformação permanente (%)

6

nd

nd

nd

 

3.2.2 - Isocianatos

O isocianato (Capítulo 1) mais utilizado nas espumas flexíveis em bloco é o tolueno diisocianato (TDI) na mistura de isômeros 2,4 e 2,6 nas proporções 80:20 (TDI 80) ou também 65:35 (TDI 65). O TDI 80/20 cru é usado na fabricação de espumas flexíveis de alta resiliência. A relação estequiométrica entre as quantidades de isocianato e as de poliol e água utilizadas é chamada de índice 100, sendo normalmente usado um excesso de 5% a 25% de TDI (índice de 105 a 125). Este excesso resulta na formação de ligações cruzadas alofanato e biureto, acarretando aumento do suporte de carga, e diminuição da tensão de ruptura, alongamento e deformação permanente. Como a acidez diminui a reatividade do TDI ela deve ser controlada.

O difenilmetano diisocianato (MDI) é usado nas espumas flexíveis moldadas, e somente recentemente tem sido empregado em algumas espumas especiais fabricadas em bloco. As espumas flexíveis de alta resiliência usualmente empregam mistura de TDI 80/20 e MDI cru, em proporções de 80/20 a 40/60. A maior reatividade do MDI cru melhora a reatividade do sistema, e a sua maior funcionalidade resulta em um maior teor de ligações cruzadas, acarretando elevação do suporte de carga, mas diminuição do alongamento, resistência ao rasgo e tensão de ruptura da espuma.

Algumas propriedades físicas das espumas sofrem a influência da relação entre os isômeros de TDI (Capítulo 1) utilizados, devido à diferença de reatividade entre os dois grupos NCO presentes nas posições 2 e 4 do anel aromático dos isômeros 2,4-TDI e 2,6-TDI. A ordem de reatividade dos grupos NCO é a seguinte: 4-NCO (2,4-TDI) >> 2-NCO e 6-NCO (2,6 TDI) > 2-NCO (2,4-TDI), e as razões entre as reatividades com o poliol são 8:3:1. Portanto o grupo NCO na posição 4 do isômero 2,4-TDI é o mais reativo e irá reagir preferencialmente com o poliol (Figura 3.1). Quando se aumenta o teor de TDI 65/35 é favorecida a reação do isocianato com a água e ocorre maior liberação de gás e calor, e devem ser efetuados ajustes na catálise por causa da menor reatividade do TDI 65/35 com os polióis.

Este fato leva a uma maior formação de segmentos rígidos de poliuréia. As propriedades de suporte de carga da espuma, tensão de ruptura, resistência ao rasgo, e módulo de compressão são aumentadas como conseqüência do maior número de pontes de hidrogênio formadas. A quantidade de células abertas também é influenciada pela proporção isômeros de TDI, e o aumento do teor de isômero 2,6 diminui o encolhimento da espuma. O TDI 65/35 produz espumas com maior passagem de ar devido principalmente a dois fatores: 1) a maior reatividade com a água, que acarreta liberação mais rápida do gás carbônico, favorecendo uma estrutura celular mais aberta; e 2) a maior formação de poliuréia, que favorece a abertura das células pela cristalização da fase rígida (Capítulo 3) provocando a ruptura mecânica do filme entre as paredes das células da espuma.

 

3.2.3 - Catalisadores

Compostos organometálicos (Capítulo 2) são os mais usados na catálise da reação de polimerização das espumas de PU (Figura 3.1-b) especialmente o dioctoato de estanho II. O octoato estanoso é normalmente diluído a 10% no poliol antes de ser usado, ou adquirido já diluído. A solução deve ser feita diariamente por ser hidrolisável (após 12 horas) pela água contida no poliol, tornando-se leitosa e perdendo a atividade. Em climas quentes e secos, após 3 ou 4 horas, a solução pode mudar de amarelo pálido para marrom escuro sem perda da atividade. Alternativamente, o dilaurato de dibutil estanho (DBTL), que tem maior atividade catalítica e resistência à hidrolise pode ser utilizado, especialmente quando são feitas pré-misturas com poliol, contendo água, aminas e silicone.

As aminas terciárias (Capítulo 2) utilizadas para catalisar a reação de expansão com desprendimento de gás carbônico e formação de poliuréia (Figura 3.1-a). Dependendo da sua estrutura, têm efeito catalítico mais pronunciado nas reações de expansão (catalisador de expansão), gelificação (catalisador de gelificação) e cura da pele (catalisador de cura da pele). Sais de ácidos carboxílicos das aminas terciárias são empregados como catalisadores de ação retardada. As aminas terciárias mais utilizadas são: 1) bis-(2-dimetilaminoetil) éter (BDMAEE) que tem forte efeito catalítico na reação de expansão reduzindo o tempo de creme da espuma. 2) Diaminobiciclooctano (DABCO) ou trietilenodiamina (TEDA) que tem menor efeito na reação de expansão do que a BDMAEE e maior na reação do gelificação, sendo útil em formulações com alto teor de cloreto de metileno. 3) N,N-dimetiletanolamina (DMEA) que tem maior atividade na reação de expansão e perde atividade nos estágios finais da expansão. Para facilitar o manuseio, estas aminas são também fornecidas diluídas em dipropileno glicol (DPG). Além disso é prática comum utilizar misturas de duas ou mais aminas para maior latitude de processo.

O balanço entre os teores utilizados de catalisadores de gelificação (dioctoato estanoso) e de expansão (amina terciária) é muito importante nas características das espumas. Quando se usa baixa concentração de catalisador de estanho, o polímero demora muito a gelificar. Neste caso ocorre a contração dos filamentos poliméricos, enquanto o líquido escoa resultando em rachos no bloco da espuma. Por outro lado, o excesso de catalisador de estanho torna o polímero demasiadamente forte e resistente à pressão interna dos gases. Como conseqüência, as paredes celulares não são rompidas, a espuma terá células fechadas, e encolherá. O encolhimento da espuma ocorre porque a difusão do gás carbônico, do interior das células fechadas, é mais rápida do que a do ar para o interior das mesmas, resultando numa diminuição da pressão no interior das células. Esta diminuição é intensificada pelo resfriamento simultâneo da espuma. Por outro lado, um excesso do teor de catalisador de expansão amina pode ocasionar rachos ou o colapso da espuma.

 

3.2.4 - Surfactantes

É essencial utilizar um agente tensioativo para controlar o processo de formação da espuma. Os surfactantes de silicone exercem uma função chave como emulsificante e estabilizadores da espuma, sendo os poliéter polisiloxanos os mais usados. A habilidade dos surfactantes de silicone de atuar como emulsificante dos ingredientes da formulação, auxiliar na nucleação, estabilizar as células da espuma em crescimento e promover a abertura das células depende de sua estrutura celular (Capítulo 2).

Os surfactantes de silicone baixam a tensão superficial permitindo a introdução na mistura, do ar que irá formar os núcleos das células da espuma. O aumento da quantidade de surfactante silicone resulta em diminuição do tamanho das células e no aumento do seu número. Concentrações adequadas de surfactante de silicone promovem a estabilidade tornando mais difícil a coalescência das bolhas. Todavia, o excesso de surfactante de silicone estabiliza demais o sistema e pode evitar a abertura das células. Na produção da espuma pode ser feita a pré mistura de água, silicone e amina (ASA), se o silicone for não hidrolisável a ASA é estável por cerca de 7 dias, porém se for do tipo hidrolisável sua eficácia cai após 24 horas.

 

3.2.5 - Agentes de expansão

O controle da densidade das espumas flexíveis (Capítulo 3) é feito principalmente através das quantidades empregadas de água e agentes de expansão auxiliares (Capítulo 2), sendo usual pigmentar a espuma para identificar as diferentes densidades. O uso de água como agente de expansão resulta na formação de segmentos rígidos de poliuréia e conseqüente aumento da dureza da espuma. Os agentes de expansão auxiliares (AEA), como o cloreto de metileno, acetona e CO2 são utilizados para a obtenção de espumas de baixa densidade mais macias. Em termos globais, mais de 70.000 mil toneladas de AEA's fluorados e/ou clorados são ainda utilizados. Todavia, devido às restrições ambientais ao uso destes produtos, vêm sendo utilizadas tecnologias empregando acetona, CO2, e variação da pressão durante a espumação.

 

3.3 - Quimica e físico-química